terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Sigam-me os bons

Jorge Ben Jor disse uma vez e disse muito bem - moro num país tropical. Além de ser abençoado por Deus e morar num lugar bonito por natureza, uma beleza, isso quer dizer que a chuva desce com uma vontade muito autêntica - e também dizem que pra descer todo santo ajuda. 

Esses dias de ausência foram também de muita emoção, mas emocionada mesmo eu fiquei quando por muito pouco fiquei com o carro parado no meio de uma inundação. Possante e passageiros passam bem, mas fiquei tremendo por quarenta e cinco minutos direto depois que chegamos em casa. Em um ponto entre a BR e a minha casa, tem um lugar que sempre inunda, um espaço de 10 ou 20 metros de adrenalina que só os fortes sobrevivem. 

Já na chegada da minha viagem a Curitiba, fui atender uns gatinhos e passando por esse lugar, suamos um pouco, mas passamos. Chegamos numa BR totalmente parada, mas com paciência e um metro de cada vez, chegamos ao nosso destino. Mas era na volta meus amigos, que a verdadeira emoção nos aguardava. Chegando no trecho fatídico, não 20 metros, mas pelo menos o dobro de trecho de inundação. Uma fila de três carros estava parada ali, o primeiro da fila dando a ré e desistindo covardemente do destino. Os outros dois carros cedendo ao clima de derrota e se alinhando ao canto da estrada. Mas o Possante nada teme, então encaramos a água e agradecemos mentalmente as nossas mães pelas aulas de natação durante a infância. Antes de enfrentar nosso inevitável caminho, proferimos palavras para os desistentes que podiam ser ouvidas tanto quanto incentivo quanto troça. 

SIGAM-ME OS BONS

E partimos. Seguíamos confiantes, o Possante dando braçadas vigorosas, os passageiros tremendo e orando para todos os santos que não estivessem com seus baldes na mão mandando água pra cima de nós e fomos. Quando estávamos pela metade, Possante quase se foi. Do seu pulmão mecânico cheio de água saíam ruídos de desespero, mas ali dentro os passageiros continuavam emanando suas palavras de encorajamento e confiança - vamo rapaz, vamo vamo vamo, o que injetou uma súbita descarga de adrenalina no Possante e finalmente ele conseguiu. Os passageiros respiravam aliviados, com tudo o que era tremível em seus corpos devidamente tremendo, aos berros comemorando a vitória com seu Celta incrivelmente 4x4 e ainda mais surpreendentemente anfíbio. 

Mas o encorajamento é uma força poderosa e transmissível e ao olhar pelo retrovisor, os carros que tinham desistido, faziam seus caminhos atrás de nós, dando buzinadas de comemoração e vitória. 

Não saio mais de casa tão cedo. Eu deveria estar indo até o centro neste momento, atender os gatos de ontem, mas graças a Deus a cliente tem uma vizinha prestativa que vai atender eles por mim hoje, então posso ficar ilhada aqui dentro de casa. E é assim mesmo que estamos. Piscinas naturais e cachoeiras se formaram no meu quintal durante a noite. Os gatis cheios d´água. Surgiu um pato do nada e ele tá bem feliz, como um pato na goteira. Juntou uma família inteira de garças, que já estão em clima de Natal e brigando umas com as outras por qualquer motivo. Meu quintal inteiro está embaixo d´água e nem que eu quisesse tinha como chegar até o carro. Bem, até tinha, só que nadando. 

Mas lembrando da última vez que isso aconteceu - nem faz tanto tempo, porque eu já escrevia aqui - eu tenho uma coisinha para agradecer. Apesar da bagunça, do caos que me espera se essa chuva persistir - por causas dos pet sitters de fim de ano, a semana de trabalho mais importante do ano pra mim - eu estou bem. Quis vir aqui antes para não quebrar meu ritmo, mas aquele sentimento que sempre vem me visitar em dias de chuva e goteira não vieram hoje. Não estou empolgadíssima para meter a mão na água suja e limpar tudo, mas também não tô sentindo nada que me impeça. Mais uma vez vou apelar para os meus fones para me ajudar na função. 

É nessas horas que eu consigo acreditar que eu realmente estou melhorando. Se é por causa da tintura que minha mãe fez, ou por escrever, ou sei lá porque, não sei. Mas tá funcionando e eu quero manter assim, acreditando e seguindo - até embaixo d´água. 

Me deseje sorte.

Até amanhã, quem sabe.

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