terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Defunto de aranha

Hoje o sol finalmente saiu. O céu tá nublado, mas o dia tá claro e já achei vantagem. Não dormi quase nada de novo, dores estranhas, insônia, livro, gatos me acordando assim que amanhece. Vocês já conhecem o rolê. Mas por incrível que pareça, apesar de cansada estou esperançosa. 

Ontem era dia de fazer minhas firmezas de proteção. Eu tava me preparando pra dormir, fui apagar as luzes quando me dei conta que eu não tinha feito a firmeza ainda. Aquilo falou tão alto comigo que fui fazer na mesma hora. E foi engraçado porque assim que eu comecei a fazer minha oração eu vi a Georgia da semana passada ali repetindo aquele gesto. Uma Georgia ajoelhada no chão segurando na mão uma vela e em outra um coração muito perdido. E aí não vi mais sentido em continuar dizendo as palavras que comecei, porque com aquela visão só fazia sentido agradecer por estar um pouco diferente de uma semana atrás. 

Me acompanha demais o sentimento de estar abaixo. Não sei se dá pra dizer oficialmente que não me sinto mais inferior aos outros, não sei se já cheguei lá, mas o se sentir abaixo continua. 
Abaixo porque parece que tenho que ter mais atenção na hora de equilibrar meus pratos. Parece que preciso fazer mais esforço pra chegar naquela média onde todo mundo parece estar naturalmente. Que eu já chego no ponto de partida com meia maratona percorrida - e obviamente, exausta - e sem chance alguma de alcançar a chegada. 

Um esforço pra me manter calma, um esforço pra não me deixar contaminar e começar a ter um monte de sintomas que uma hora ou outra durante o dia vão me fazer largar os bets e ir pra cama. 

O ano tá quase acabando e se tivesse uma retrospectiva da vida igual a do Spotify, o meu diria "você passou tempo demais deitada aqui". Deitada esperando a dor passar, deitada imaginando o que eu poderia/deveria estar fazendo se eu não tivesse me sentindo uma merda. Acho que é por isso que eu deito e vivo intensamente no meu mundo mental. Tá certo, a gente vive no mundo mental normalmente mesmo. A gente não toma nenhuma decisão sem que aquilo seja filtrado pelas nossas emoções, mas com tudo o que já sei agora eu deveria aproveitar desse artifício de uma forma um pouquinho mais inteligente pra sair desse umbral particular. Apesar de ser um espaço especialmente criativo é como se esse mundo me chamasse com um grande algodão doce colorido pra na sequência ele se transformar em uma placa ululante que diz "VOCÊ VAI TER CÁRIES! MUAHAhahaha"

Mas hoje apesar de ter acordado com tudo errado - até encontrei um presunto de uma aranha gigantesca embaixo aqui da mesa - parece que hoje estou tendo uma colher de chá. Talvez ela não me mate a sede, mas se isso é tudo o que me é oferecido, beberei. 
Graças a Deus por meus gatos matarem as aranhas por mim. Aqui em muitas e todas elas são grandes, mas essa estava de parabéns, era enorme mesmo morta e dobrada. O tipo de crise que eu teria se eu encontrasse ela viva por aí certamente poderia ser avistado pelos satélites. Eu tenho pavor. Mas dessa vez o dia foi salvo. Eu fico passando a mão pelas pernas e sentindo alguma coisa caminhar por mim, mas eu sei que é só o medo me atormentando. Eu vou continuar escrevendo e eu vou tentar fazer desse dia um dia que eu possa aproveitar. 

Ontem eu li que um dos efeitos do patriarcado é a forma como temos levado a nossa vida interior. Ser prático, racional, produtivo, "matar um leão por dia". Esquecemos que, homens ou mulheres, sentimos o mundo, sentimos a vida. E o sentir é feminino e tudo o que é feminino precisa maternar. Talvez seja só uma maneira de falar sobre se acolher e dar tempo ao tempo, mas gostei da imagem de maternar a cura. De deixar aquele sentimento fazer o que ele precisa, trazer as reflexões e abrir o que precisa ser aberto, pra sangrar e se deixar curar, até que cure. 
Percebi o quanto meu feminino está doente quando percebi que a minha primeira resposta pras coisas é "como eu resolvo isso?". Como se fosse uma tarefa da minha listinha. Apesar desse distanciamento e praticidade terem salvo o meu couro muitas vezes, talvez essa ansiedade e depressão insistentes seja reflexo disso. De achar soluções demais e curas de menos. 

Eu já me acho sentimental demais por estar aqui escrevendo essas cartas. Já me acho um saco por estar carente de atenção e fragilizada. Não é como eu gosto de me ver, não é quem o meu Hulk interior me diz que sou. Mas talvez seja só uma das minhas muitas vozes. E talvez todas elas precisem de espaço para serem ouvidas. Eu não sei se eu consigo ou se vou conseguir me entregar a isso um dia. Tanto que a vida já me quebrou e tenta me quebrar constantemente e eu ainda não me permito chorar. Eu deito e leio, viajo no mundo que alguém criou. Me isolo, racionalizo tudo. Em alguma medida eu estou sempre tentando achar uma solução, as vezes com mais força, as vezes com nenhuma. Quando voltei a escrever aqui estava me sentindo totalmente derrotada, mas eu fiz esse movimento. A única coisa que mudou de semana passada pra cá foi que eu consegui organizar melhor meus pensamentos escrevendo esses posts. Porque sigo sem dormir, sigo com vontade de chorar, sigo me sentindo sozinha na vida. Então tenho medo sim de deixar a emoção tomar conta, se mesmo sem permitir eu fui derrotada tantas vezes, imagina se eu permitisse sentir tudo? 


É, tem coisas que a gente só vai saber caminhando mesmo. 

Até amanhã, quem sabe.

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