quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Café da manhã


De manhã a mesa posta estava toda ali só me esperando.
Então sentei e comi com os olhos minhas opções. 
Adocei meu café e me servi. 
No primeiro gole, o gosto forte das palavras; aquelas que não descem, aquelas que não tem coragem de sair.
E pro recheio do pão, eu resolvi engolir só o que me saliva a boca. 
(mas as vezes acontece de vomitar o que faz mal)
O resto fica ai na mesa posta, pra outro dia, pra quem apetecer...

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Antes de dormir


De creme na mão perfume no peito e meia no pé eu termino meu dia.
Café cheirando na caneca, manteiga derretendo na torrada, a louça limpa pra amanhã.
Cabeça no travesseiro, um suspiro e um conto teimoso escrito no teto.
Vai dormir menina, apaga essa luz!
Tô indo! Já vou! Mas o Jerico tem que ir dormir também, olha ele, ó!

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Sanguinersário

EU SEI que ela vai me matar. 
Só não sei quando vai acontecer. Mas está certo, (escrito) que isso vai sim acontecer.
Ela é uma pessoa que sabe esperar o momento exato. E ela está esperando. Eu sei disso, posso sentir.
Foram treze anos. Um ano seguido do outro, e a mesma coisa se repetindo, redundante. E a mesma desculpa.
Um dia entre 364 outros. Apenas um dia em que eu precisava mesmo dar aquela telefonadinha simpática. 
Treze anos. 
Treze chances de telefonar no dia certo e o toque só tocou com dois dias de atraso. 
Ô meu Deus, chegou a hora. É agora. É hoje que me despeço.
Não adianta mais pedir perdão. Quando ela chegar, armada e silenciosa vai dizer - provavelmente dois dias depois, só por ironia - "Ah querida, me desculpe, vi só agora que fui largar este machado (olhe só) justo no meio da sua cabeça!"
(Vamos considerar a idéia do machado.)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

De cama

EU OLHAVA pela janela e via tudo lá, as coisas como sempre estiveram.
O acontecer acontecendo, continuando. O meu também, inclusive. 
Só que enquanto eu olhava ali, eu tinha menos consciência do que acontecia em mim, pra botar reparo no que acontecia lá fora. 
Sentia saudade, vontade, o que quer que seja. Um punhado de coisas. Talvez o que eu tava sentindo tivesse até um nome feio.
E ninguém me via enquanto eu olhava. Quem sabe eu estivesse só sonhando. É, provavelmente era isso mesmo.
Eu estava sonhando que da minha janela pra dentro ninguém podia ver, nem me ouvir, mesmo que eu batesse com força a mão no vidro. 
bam. bam. bam.
Mas nada acontecia. Eu estava sonhando que as crianças ainda brincavam lá fora, com os cachorros correndo em volta, e os vendedores insistindo em insistir. Lá fora tinha sol, tinha barulho e tinha cor. 
Aqui dentro só tinha eu e a minha janela num fundo meio azul. 
Foi só um sonho sim. Mas já tá quase acabando.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Pereba

Eu acordei cinza igual ao dia de hoje.
Sem voz, sem cor, sem cheiro, sem sabor.
Nada do que eu vi passar cutucou aqui na vontade de escrever.
O dia tá passando e eu fungando,
Um gole no chá, atchim, alô só um pouquinho, tosse tosse tosse
Isso aqui tá muito chato.
Ô pereba, vai embora que eu já cansei de brincar de lenço remédio e ai-ai-ai.
E devolve minha voz que não tem a menor graça ficar com voz de ventinho.
(Ara...)

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Ainda bem

Praticar uns agudos no chuveiro.
Matar as cadelas de tanta cócega.
Contar as fofocas pra suculenta que ficou plantada o dia todo, só esperando pra saber.
O latido de alegria da galera porque a campainha tocou e as visitas finalmente chegaram.
Copo xícara talher tilintando e as histórias boas que cambalhotam de um lado pra outro na mesa.
Aquele suspiro alto de alegria, deitada na cama, pelo dia que acabou de acabar.
Minha vida faz um barulhão. E graças a Deus por isso.

De lascar

AQUELA grama branquinha, os vidros todos respingados de orvalho. A fumacinha saindo pela boca (dentro de casa)
Crianças brincando com suas luvas coloridas sentadas lá fora, escrevendo no gelo. Sorridentes.
Bonito né... Bonito nada.
Porque a verdade é que bonito mesmo num dia desses, é nem tirar o nariz pra fora da cama.
(quem sabe eu abriria uma exceção,
só prum chocolate...)

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Faladô

Blablablablá-blablablá. Pêpêpêpê-pêpêpê.
Ela não pára. Fala mais que vendedor de fruta em dia de feira.
Que comadre na saída da igreja.
E é só ela parar pra respirar, que o telefone toca.
Quando ela desliga e toma fôlego, chega alguém na porta (ô dona Eliane, cê pode me ajudá?)
Pêpêpêpê-pêpêpê
Eu que só queria terminar o conto. Tudo bem, a gente espera.
Contaí mãe, como é que foi mesmo?
Pêpêpêpê-pêpêpê
(Que que é essa cara? Que que ce tá fazendo? Tá escrevendo mal de mim?)

Tô nada, tô aqui achando graça. Daqui a pouco é a minha vez. 

Um causo

Era noite e eu na rua, pensando no melhor caminho pra voltar pra casa.
Eu não precisava nem me preocupar, porque no final eu ganhei carona pra voltar.
Só que eu ainda não sabia disso.
Cheguei ao ponto de ônibus e enquanto o cara encostado ali me explicava sua receita de macarrão à carbonara, eu ainda decidia se esperava ou não a boa vontade daquele ônibus aparecer.
Quando desisti, o chef desistiu junto.
E ai fomos andando, eu ele e a fome que seguia logo atrás, animados com as bobagens dessas amizades que duram 10 minutos.
Ele me emprestou sua compania e eu devolvi, assim que atravessamos a praça.
Quando me dei conta - obrigada - eu já tinha passado o pedaço ruim de atravessar. Tava quase em casa.
Queridas, cheguei!

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Cambalhota

FANIQUITO é quando tem um troço esquisito dando cambalhota aí dentro da sua cabeça, mas você não sabe muito bem o nome dele.

Mau tempo



QUANDO acordei, achei que tinha esquecido tudo.
Não sabia onde tinha enfiado a vontade nem a inspiração.
E eu tinha certeza de que eu tinha deixado tudo no lugar, antes de dormir.
Procurei nos armários, no meio das meias, nos bolsos da jaqueta e naquela bolsa que eu quase não uso.
Revirei a casa toda.
No fim, tava tudo escondido dentro da sombrinha pendurada atrás da porta.
Como eles foram parar lá é que não sei. Acho que queriam me fazer surpresa.
Fazer essa temporada de chuva que vem vindo, mais recheadinha de sabor.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Botãozinho adicional



EU ESCREVI.

Depois, desenhei (para mais informações digite 2)
Bati meu recorde do jogo da cobrinha no celular (tic tac tic tac)
Aproveitei pra tirar os sapatos e sentar em cima da perna, já que provavelmente o troço ia demorar mesmo.
Aí comecei a contar os ciclos da mensagem de espera (para voltar ao menu principal digite 9). Vinte e sete ciclos.
E continuei esperando e já me preparando psicologicamente pra ouvir aquela musiquinha buzinando na cabeça o resto do dia.
(por favor, aguarde, já estamos encaminhando a sua ligação)
- Alô moço, então, deu um troço no meu trem, que é que faz?
- Nesse caso não há nada que possa ser feito, senhora. 
- Nada? Assim, só isso? Sem esperanças pra mim? 
- Infelizmente, senhora. Agora gostaríamos de contar com sua participação para uma pesquisa de opinião sobre o nosso atendimento (por favor, digite o código do atendente)
Nesse momento eu imaginei meu telefone com um grande botão vermelho de emergência. Me tira daquiiiiiiiiii!

terça-feira, 16 de agosto de 2011

domingo, 14 de agosto de 2011

Pai de verdade


MEU PAI não foi um cara bacana. 
Ele jura que não sabe porquê, mas eu desconfio aqui pra mim que ele deve saber bem, sim.
Começando pelos anos em que eu só recebia notícias dele quando ele aprontava uma (pra nós). E pelas vezes todas em que não sentamos juntos pra jogar conversa fora. 
Por eu ter sentido mais medo que alegria quando estava perto dele. E do número de abraços que dá pra contar numa mão. 
Das raríssimas vezes que parei pra contar coisas boas sobre ele (e que hoje eu nem lembro mais o que era). 
E por eu morrer de medo de me sobrar um sanguinho ruim e eu acabar ficando igual.
Mas a pior parte é hoje ter saudades de um pai que ele não foi (nem um pouquinho) e que só deu uma passadinha rápida pela nossa vida só pra mudar nossa opinião.
E deu certo. Eu morro de saudades desse paizão que me emprestaram por um tempinho. Pena que não dá pra pedir ele de volta.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Cabelo de artista

NUMA tentativa de interceder pelos meus cabelos desarrumados, minha mãe me deu de presente uma chapinha. Já adianto que não resolveu muito, porque isso já faz alguns anos e minhas madeixas estão como estão (daquele jeito).

Então hoje acordei disposta e resolvi tomar uma atitude em prol do Movimento Cara de Gente. Botei a dita na tomada, deixei esquentando, depois alisando alisando e alisando pra dai deixar esfriar. 
Saí de casa direto pra passarela da vida (um tiquinho de exagero, admito)
15 minutos depois, sentei no ônibus, abri o livro e vi meu reflexo no vidro da janela. 
Vi inclusive o reflexo de cachos e mais cachos, também. E que por coincidência vinham, olhe só, da minha cabeça. 
Tudo bem, eu ainda estava parecendo artista com aquele cabelo. O Tim Burton, quem sabe.


quinta-feira, 11 de agosto de 2011

E agora?

IMPACIÊNCIA é quando você já contou até 10,  e de novo (de trás pra frente agora), e ainda não aconteceu bem o que precisava.
A gente já chegou?

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A/C Direção

O PAPEL em branco na minha frente.
Essa chuvinha escorrendo pela janela.
O escritório sem luz.
O meu pé direito, que está molhado.
A caneta que funciona só quando eu faço aqueles risquinhos pra testar.
Não parece exatamente o começo de um dia promissor.
Dá pra reclamar pra direção? Quem sabe um sol e uma caneta eficiente, pra começar...

Aí, mano

ANSIEDADE é quando uma britadeira aparece ameaçando seu coração, dizendo que vai deixá-lo em pedacinhos a qualquer momento.
(é só você ficar aí dando bobeira mano)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Xô urucubaca!

NUNCA fui muito de prestar atenção nessas crendices que o povo fala.
Mas eu tirei 15 folhinhas secas do vasinho de pimentas outro dia,
  e minha torradeira pegou fogo hoje de manhã, bem na segunda fatia.
Eu podia até ter confundido com um isqueiro, se eu fumasse (e se eu bebesse). Mas não.
Provavelmente algum olho gordo, querendo que eu faça regime.
Nem pra esperar eu terminar meu café...

Encaixotando

Tem decepção que não tem especificação de tamanho. Por isso vem de fábrica com nome escrito, pra ficar mais fácil de classificar.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Cara boa

Vim descendo a rua, brincando com a vida,
  andando só nas pedras brancas, cantarolandinho (foi por isso então que você chegou atrasada, não foi?)
Semana nova, dia de sol e bastante trabalho pela frente.
Daí passa por mim um cara me olhando como se eu fosse verde. E depois uma mocinha.
E outro e outra outro outro outra (será?)
No ônibus escondi minha cara (provavelmente verde) no meio do livro, sentada de lado e virada pra janela. 
Quando cheguei no trabalho, ela veio até mim com um sorriso maior que a cara (ai meu Deus é verdade eu estou verde)
- Ei, dá uma olhada, tem alguma coisa errada comigo? Minha roupa tá do avesso, tem alguma coisa escrita na minha testa, sei lá, olha aí pra mim por favor...tá todo mundo me olhando esquisito.
- Não, não tem nada de errado não. Você tá com uma cara boa hoje, deve ser isso.

(é né, verde combina bem com meus olhos...)

sábado, 6 de agosto de 2011

Nublado

A SAUDADE é uma nuvenzinha que passa dentro da cabeça, e que depois faz chuva pelos olhos.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Capítulo 26, parágrafo 12

A VIDA dele na minha durou menos que um potinho de geléia.
Da mesma forma que veio, foi, sem cerimônia, sem sofisticações.
Uma aparição rápida sem direito a nome nos créditos finais.
Só mais uma liçãozinha na apostila da vida.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Coisa de criança



QUANDO eu era pequena eu não gostava de ler (gibi acho que não conta)
Mas eu gostava de livro, achava tão bonito.
Eu me pendurava na estante pra ver os títulos (e aqui você pode imaginar a alegria da minha mãe quando eu fazia isso) até escolher um.
Dai então eu sentava no chão e botava a mãozinha na capa, fechava os olhos pra me concentrar e tentava adivinhar tudo o que podia estar escondido ali.
Mas fui vencida. Tive que começar a abrir os livros pra descobrir o que tinha dentro.
Hoje eu sou grande, mas eu ainda quero uma estante enorme (e cheia) pra me pendurar...


(Madame Gaston, mas que horror!)

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Receitinha

RAIVA a gente coloca no triturador (e depois de novo)
  adiciona farinha e ovo,
  ajeita o sal, faz bolinho e engole.
Não sem antes fritar bem, claro, até dar o pontinho.
(voilà)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Ô coitada

ELA VINHA vindo na minha direção. 
Pelo tamanho do papel ela podia estar lendo uma carta de amor (daquelas que repetem um milhão de vezes aquela mesma sequênciazinha clichê)
Ou de despedida, se for julgar pela cara que ela fazia enquanto ia lendo.
Mas reparando bem, aquele tipo de papel era familiar. Eu também já tinha recebido um daqueles um dia. 
Não era uma carta.
Anotei depressa uma nota mental: nunca confira seu extrato bancário antes das 7 da manhã, pode ser muitíssimo prejudicial para o seu dia. 
(a não ser que você seja o novo ganhador da Mega)

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Raios e trovões



EU AINDA não aprendi a gostar de dia de chuva.
Talvez porque eu nunca consigo dormir e depois não sei como (se eu não dormi), não consigo acordar. 
O cabelo vira aquela paçoca, a sombrinha - que serve pra que mesmo? - molha a mão que tá cheia de creme e vira uma meleca.
O sapato deixa molhar a meia, e que se não molha a calça, o carro passa e te dá um belo de um chuá. E depois passa o ônibus (e chuá)
A bolsa que molha, que molha o livro que molha o celular, que daí fica o dia inteiro dando faniquito.
O joelho molhado. A jaqueta molhada (e curta) que pinga na bunda. É, na bunda mesmo. 
E o capuz que fica guardando água pra depois.
O All Star que escorrega (e que se leva tombo, molha a bunda de novo)
Em dia de chuva todo mundo tem mais pressa e ninguém anda. 
Congestionamento de sombrinha embaixo da marquise. Congestionamento de gente na cidade inteira. 
Ainda bem que sombrinha não tem buzina.